quinta-feira, 22 de julho de 2010

Aquisições em Julho

Férias do Teatro! Para aqueles que não sabem, sou ator também. Sou integrante do Teatro Popular União e Olho Vivo há 10 anos. Nos apresentamos na periferia de São Paulo gratuitamente há 44 anos.

Mas esse não é um post sobre o teatro, pelo menos ainda não. Acontece que em julho entramos em férias e eu tenho 04 finais de semana livres. Não parece muito, mas é.

E daí eu aproveito pra tirar um pouco do atraso, ou seja, leio o mês inteiro. E o mês ainda nem acabou e olha só onde eu me meti:

1. Overdose de muleque hiperativo

calvinCalvin é um clássico. Só pode ser classificado de genial por falta de adjetivo melhor em nossa língua. Altamente recomendável para crianças com idade entre 07 e 90 anos.

E eu resolvi comprar 03 de uma só vez!

como tudo começouDeu tilt

2. Papo Cabeça

cheComprei Che, sugestão do amigo Lucas “Korak” Pimenta, um dos colaboradores do Projeto Continuum e também um dos mentores do futuro Quadro a Quadro (vocês ainda ouvirão falar muito nisso).

Todas as opiniões anteriores foram extremamente passionais – ou a chamavam de panfletária ou de genial, dependendo da opção política do perguntado. O Lucas foi o único que apresentou um argumento irrefutável. Com a palavra o mestre Korak: “é inegável a qualidade do seu texto (Oesterheld, o roteirista), do domínio de narrativa... Do conhecimento absoluto de como fazer uma ótima HQ...”

Junto com Che, comprei também Três Dedos: Um Escândalo Animado. Li as críticas na época do lançamento e me interessei, mas o preço não tava bacana. Então cruzei com ele numa promoção na Internet…

Ainda não li, mas o trailer é absurdamente bom:


3. Para Aprender Mais

quadradosSemanas atrás, escrevi sobre o livro Quadrinhos Dourados, do Professor Diamantino da Silva. Agora, depois de ter lido o livro há 20 anos, achei num sebo Quadrinhos para Quadrados, do mesmo autor.

Não deu pra resistir. Não dá pra gastar 50 conto em uma edição encardenada, com papel afrescalhado e prefácio do professor pardal e não investir 15 numa preciosidade dessas. Leitura obrigatória para os amantes de quadrinhos.

4.   Quem disse que Herói Nacional não pode?

Tem alguns caras que são inclassificáveis. Um deles é o Wellington Srbek, autor do já clássico Estórias Gerais, que além de possuir um roteiro magnífico, foi desenhada pelo Mestre Flavio Colin.

O blog do Wellington – o Mais Quadrinhos – é um daqueles lugares na Net onde você pode adquirir conhecimento de alta qualidade sem pagar nada por isso.

É lá que entro quase diariamente no último ano e onde tenho aprendido muito. O Wellington é do tipo que não deixa um único comentário sem resposta e tem sempre algo a oferecer a favor dos quadrinhos, sobretudo os nacionais.

Foi lá também que conheci o Solar, super herói de autoria do Srbek. Gostei das matérias, das críticas e comentários. Só faltava conhecer os quadrinhos.

SOLAR-SoloSagradoSOLAR_Capa

4. E para livrar a cara…

Daí entramos na Livraria Saraiva, eu e minha esposa.

Por incrível que pareça, ela veio me perguntar sobre um gibi, no caso, um gibi pouco convencional: Diário de um Banana.

diario_de_um_bananaNão pensei duas vezes. Emendei de primeira uma das minhas Papagaio de Pirata (quando você repete literalmete aquilo que ouviu, sem saber extamente do que tá falando):

- Meu amor, é genial. Não comprei ainda porque tava caro.

Tô falando… Um dia eu chego e encontro a casa pelada e num envelope jogado no chão os papéis do divórcio…

 

Enfim, o mês promete…

domingo, 18 de julho de 2010

Minha primeira Calafrio

Olhando meus sobrinhos hoje em dia tenho sentimentosconflitantes. De um lado uma inveja danada, essas crianças tem tudo aquilo queeu nunca poderia sonhar na idade delas: videogame, computador, celular,brinquedo que fala, que anda sozinho, DVD com todos os desenhos preferidos parase ver e rever cinco mil e quinhentas vezes.
E a lista não pára, é enorme.
Não sei como o piralho do Vinicius (parece um anjo barroco omoleque) consegue naquela cabecinha de meia dúzia de anos absorver tanta coisa.
Confesso: é inveja.
Eu sei que é feio, mas eu já tenho quase quarenta, possoconviver com isso.

Por outro lado...

O ano era 1981 e eu ainda não tinha completado nem 09.
Íamos para Macaubal, cidade natal dos meus avós e onde meupai nasceu. Foi uma viagem inesquecível. Tá que acabei enrolado numa cerca de aramefarpado e tiveram que me tirar de lá na base do alicate. E também comi umpunhado de soda cáustica pensando que era açúcar e quase fui pro saco. E não éfigura de linguagem. Hoje, pensando nessas coisas, chego à conclusão que tenhouma grande parcela de culpa nos problemas de saúde da minha mãe.

Mas definitivamente não foi isso que mais me marcou naquelaviagem. Mesmo porque as situações acima eram quase que cotidianas naquela minhacurta vida e aqueles foram só alguns contratempos que me impediram de brincarpor um dia ou dois.

De São Paulo a Macaubal são mais de 500 Km. Viagem longa comduas crianças e a terceira querendo chegar. E entre as duas crianças estava eu,que não parava no banco do ônibus e tumultuava a vida dos meus pais.

Meu pai quando morreu me deixou de herança apenas um relógio– lindo, mas não funciona – uma máquina fotográfica Olympus – com o obturadorquebrado – e um par de abotoadeiras – essa é melhor nem comentar.

Mas entre essas poucas coisas que possuem valor apenassimbólico, ele deixou algo que eu nunca poderei pagar: o gosto pela leitura.

Foi ele quem me comprou o primeiro gibi. Foi também ele quemtrouxe num dia o Capitão América nº 07 e me apresentou um fantástico mundo desuper heróis, o que desgraçou minha vida para sempre, como já contei aqui.

Naquele dia, na Rodoviária, pouco antes de embarcar numaviagem de 8 horas, ele percebeu que a melhor maneira de controlar aquelediabinho loiro que as pessoas diziam que era seu filho seria passar antes numabanca de jornal. Quando descemos a escada para pegar o ônibus, minha mãesegurava pelas mãos minha irmã, meu pai estava escondido numa montanha de malase sacolas e eu tinha 03 gibis novinhos: um Capitão América, um Heróis da TV eum outro gibi grandão, com um nome esquisito e uma capa horripilante.

Eu ainda não sabia, mas tinha acabado de ganhar o primeiroexemplar de uma das maiores paixões que tenho em quadrinhos.

Meu pai acabava de comprar minha primeira Calafrio.

Eu não sei o ritmo de leitura das pessoas, mas eu, com ovocabulário limitado dos meus oito anos, devorei imediatamente a CapitãoAmérica antes da primeira hora.

(Mas não vale né? Essa série da Abril era bem fininha.)

Já Heróis da TV demorou um pouco mais. Meus pais estavamfelicíssimos. Até a primeira parada eu não havia aberto a boca, tão entretidoque estava nem queria descer do ônibus, fui sob protestos.

Acabada também a Heróis da TV meu pai começou a ficarpreocupado. Tinha mais umas 3 horas de viagem e eu já começava a ler o últimogibi.

Senhores, eu li e reli. E quando terminei de ler fiqueiolhando as figuras, página a página, fascinado.
Até ali, eu não sabia que existiam quadrinhos de terror.Pensava que eram só nos filmes que tínhamos monstros e fantasmas. Foi amor àprimeira leitura.
O demônio dos quadrinhos me pegou ali, naquela viagem, comaquela Calafrio nº 3.

Até hoje aquele nº é um dos meus gibis preferidos. Oexemplar original acabei doando para a Gibiteca. Recuperei-o apenas há algunsanos.

Foram 03 histórias das quais nunca me esqueci: Strega, nobelíssimo traço de Colonesse, Noite de Lua Cheia, uma história de apenas 02páginas sobre – claro – um Lobisomem, e A Árvore Maldita, uma das melhoreshistórias de terror que já vi na vida.

Strega é uma história de amor, ódio e assassinato. Colonessesempre desenhou belas mulheres, mas Strega é insuperável. Exuberante, despertaa paixão de um pintor e se torna sua musa. A obsessão o leva ao assassinato.
O corpo de Strega morta, acusando seu assassino, de olhosvidrados, é uma das imagens mais fortes da minha infância.

Noite de Lua Cheia teria passado despercebida. Mas eu estavano interior e naquela época as distâncias eram um pouco maiores e a imaginaçãodo populacho mais fértil. Aproveitei a história que acabara de ler no ônibus ea contei para os meus primos, como se fosse verdade e tivesse acontecido com opai de um amigo, ali no Cemitério da Vila Formosa, do ladinho de casa.
Orgulhoso do meu pequeno engodo, não esperava o que veio aseguir. Meus primos, excitados pela história que acabava de contar, resolveram tambémeles me contarem as suas.
Poucas vezes na vida passei tanto medo. Naquela noite dormino modesto sítio do meu tio, num breu total, com aquela janela de madeira quenão fechava. Eu tinha certeza que tinha um Lobisomem lá fora. E aí me deu aquelavontade louca de mijar. E é claro, o banheiro era uma daquelas casinhas afastadas, tão comuns no interior, praticamente do lado do Lobisomem...

Já a Árvore Maldita tem um dos roteiros mais bacanas que já vi.Conta a história de uma árvore assombrada pelo fantasma de um escravodecapitado. A única forma de acabar com a maldição seria encontrar a cabeça donegro e enterrá-la junto ao corpo.

Simples, original e assustadora.

O autor, embora na época eu nem ligasse para isso, é oprofícuo paraense Edmundo Rodrigues, veterano responsável por uma boa parcelada produção nacional entre as décadas de 60 e 90.

Seu traço elegante, sem firulas estéticas e com ângulosmuito bem enquadrados, se encaixa perfeitamente à boa história, também de suaautoria.

E aquela maldita árvore estava muito viva na minha cabeça(eu já tinha relido o gibi umas cinco vezes naqueles dias) quando, também anoite, voltávamos da casa de um outro tio.

Desnecessário dizer que esse outro tio morava longe de ondeestávamos hospedados.
E voltávamos eu, minha irmã e meus pais, lá pelas nove danoite, por uma estrada de terra. Só a luz da Lua iluminava o caminho.
Então, parado numa desgraçada duma árvore muito parecida coma da história, tinha um velho negro pitando um cigarro.
Ao passarmos por ele, como reza a boa educação, meu pai lhedeu boa noite.

O velho senhor respondeu naquela educação sincera de genteinteriorana.
Mas pra mim bastou. Saí correndo que nem o diabo, sem meimportar muito com os gritos da minha mãe.

Parei uns 50 metros a frente, ofegante.
Quando meus pais me alcançaram minha mãe torpedeou:

- Que foi isso de sair correndo menino?
- Era o João Velho mãe! Ele ia pegar a gente!

E para mim, os olhos daquele senhor eram os olhos ausentesdo escravo decapitado. E não houve cristão que tirasse isso da minha cabeça.

Aquela Calafrio honrava o título. Pelo menos para aquelegaroto de oito anos, que lia pela primeira vez uma história de terror.

Eu não sei os medos e fantasias que nossas crianças passamagora. Num mundo onde um simples jogo mostra coisas muito mais apavorantes doque aquele gibi, o Vinicius vai lá, dá enter e pronto: o monstro morreu.

Não tenho dúvidas que as crianças continuam enxergando seusfantasmas, criando seus mundos particulares, se apaixonando por mulheres dementira como eu me apaixonei pela Strega.

Mas naquele tempo o sobrenatural era palpável, assombras podiam se tornar qualquer coisa, e um gibi era a porta de entradapara outra dimensão.
E é esse mundo de fantasias, amores e horrores que me parece hoje irremediavelmente perdido paraas novas gerações.


terça-feira, 6 de julho de 2010

Para aprender mais: Quadrinhos Dourados – A História dos Suplementos no Brasil

Tem dias que essa vida de bancário é um saco. Não chegam aser tantos a ponto de tornar o emprego insuportável, mas está muito acima dodesejável.

Minha política sempre foi: não leve o trabalho para casa.
Então, nesses dias, uso uma velha técnica aprendida numemprego muito pior, lá nos idos de 90: saio andando sem rumo.

Sim meus amigos, andar me relaxa e eu chego em casa zerado.Esqueço de praticamente tudo o que aconteceu durante o dia.

Minha esposa sempre agradeceu essa minha capacidade, mantéma sanidade do relacionamento.
Mas tem um efeito colateral: sempre que eu ando, uma hora euparo.

E quando paro geralmente tem gibi envolvido.

Foi numadessas andanças, depois de um dia pior que vinho ruim, que parei para bater umpapo com o Sr. Manoel, dono da LivrariaTemos Livros.

A Temos Livros fica ali na Avenida SãoJoão, no número 526, e é um daqueles lugares inacreditáveis de São Paulo. Seudono, português de seus 60 anos, de humor ferino e inteligência ímpar, é um fãde quadrinhos e sempre oferece, gratuitamente, horas de boa conversa e risosincessantes. Também pudera, ele foi um dos sócios da Muito Prazer, naquela mesma Avenida São João, nos anos 80.
Para quemnão conheceu a Muito Prazer possoapenas dizer que era o melhor lugar do Universo. Ali você encontravapraticamente qualquer gibi publicado no século XX neste lado do Hemisfério Sul.

E enquantovou conversando, vou fuçando. Meio despretensioso, pego uma coisa, folheio,pego outra, converso, fico ensebando com algum livro na mão, dou risada, equando vejo já gastei pelo menos 50 contos (essa parte minha esposa não sabe).

Quando dei por mim já estava no metrô, a caminho de casa, lendo QuadrinhosDourados – A História dos Suplementos no Brasil (Ópera Gráfica Editora,2003), do Professor Diamantino da Silva, autor do clássico Quadrinhos para Quadrados.

Esse é umdaqueles livros teóricos deliciosos. Escrito em 1ª pessoa, é muito mais umlivro de memórias. Só que são as memórias de um moleque lá de Santos, quecoincidiu sua infância com a infância da indústria de quadrinhos nacional. Emespecial com o surgimento dos Suplementos Infantis no Brasil.

O tompessoal da narrativa e suas insuspeitas predileções juvenis, aliadas à suavasta experiência profissional no ramo, tornam o livro não apenas um apanhado dememórias sobre aquelas publicações, mas um guia altamente recomendável parapesquisadores, estudantes e fãs do gênero. Embora seja um livro relativamentecurto, suas 95 páginas nos dão uma precisa noção da fase áurea daqueles precursores dosatuais gibis.

Com umavasta lista de autores, editores e profissionais, podemos acompanhar a trajetóriadaquelas publicações desde a edição inaugural do Suplemento Juvenil em 1934, por iniciativa de Adolfo Aizen, até aderradeira edição de O Globo Juvenil,de Roberto Marinho, em 1950, além de curiosas revelações sobre os bastidores domeio editorial da época.

Possui atéum guia de seriados cinematográficos (exibidos nas famosas matinês) com os inesquecíveis Dick Tracy, Mandrake, Jim das Selvase até Terry e os Piratas. É claro que se tratam de seriados produzidos nas décadasde 30 e 40, com roteiros deliciosamente absurdos, que faziam as crianças perderem o fôlego no final e aguardarem ansiosamente pelo próximo capítulo.

Enfim, um ótimolivro escrito por alguém que entende do assunto. Feito sob medida para quem quer conhecer o tipode gibis que nossos pais e avós liam quando crianças.